Pérsia - Fotos

Criado ao longo de 2021, o espetáculo Pérsia procura estabelecer conexões entre as Culturas brasileira e persa, especialmente nos campos do Teatro e da Música, e busca enxergar, em um espelho iraniano, o nosso próprio reflexo. Misturando depoimentos do elenco e de imigrantes iranianos, em uma dramaturgia criada ao longo do processo de montagem, Pérsia revela anseios comuns de liberdade, de comunhão e de alegria. “No Irã, apesar do autoritarismo, algumas coisas se preservam graças a uma bagagem cultural enorme que o país tem e ao culto da Poesia e da Arte. Graças a isso, não deixamos que a violência invada a nossa casa ou nós mesmos", revela Sandra. “Nós percebemos que a direita avança no Brasil amparada pelo fundamentalismo, mas nós também temos a Arte e a Cultura que constituem uma barreira, uma forma de reistência conra todo autoritarismo”, completa.

A música está presente ao longo do espetáculo e a pesquisa também apontou diversas aproximações entre as manifestações dos dois países. “Às vezes, temos a impressão de que a música persa é muito exótica, mas temos a mesma relação com ela, com a poesia e, com um pouco de atenção, rapidamente ela nos soa familiar”, diz Luiz André Cherubini. “Buscamos orientação de músicos iranianos em várias áreas e usamos instrumentos persas e brasileiros. O espetáculo busca conexões por meio dessas pontes, tanto fazendo música brasileira tocada com esses instrumentos persas, quanto fazendo música persa tocada com instrumentos brasileiros”, diz.


A ENCENAÇÃO

O cenário é árido - apenas uma árvore seca - e representa um deserto, um sertão. Ao redor dela, os atores contam as histórias de iranianos que precisaram deixar seu país, por diferentes motivos, e que encontraram no Brasil um novo lar. As personagens que, como aves migratórias, atravessam continentes em busca de novas paisagens, confessam seus medos, seus sonhos, suas aflições, em palavras ditas e cantadas. Em cena, a casa é o único objeto que evoca as tantas moradas que deixaram para trás e que ainda carregam consigo.

Ao longo do espetáculo – e dos relatos -, os atores e as atrizes preenchem o deserto de suas memórias com pequenas casas, que lembram casas de passarinhos, e criam pequenos mundos: podem ser um bairro, uma cidade ou um país. Em uma atmosfera mais íntima, o espaço teatral está configurado em uma arena e os figurinos de João Pimenta – premiado estilista que é parceiro do grupo há quase dez anos – carregam elementos de ambas as culturas. O cenário do espetáculo foi indicado ao Prêmio Shell de Teatro de 2022.


O SOBREVENTO E O IRÃ

O Grupo Sobrevento esteve em Teerã, em 2010, em um dos maiores festivais de Teatro do mundo, o Fajr Festival (Festival Liberdade). Naquela ocasião, o grupo conheceu a vitalidade do Teatro naquele país, com uma Cultura milenar de origem persa, que brilha em cada canto da cidade: no hotel que tem nome de poeta, na poesia que está na boca das pessoas, nos milhares de jovens na praça diante do centro cultural, nas longas filas para os teatros, na produção de conhecimento histórico e artístico dos já antigos cursos de Teatro e de Teatro de Bonecos (e de Música internacional e de Música tradicional iraniana) da importante Universidade de Teerã, na alma artística, culta, esperançosa e ansiosa por liberdade de todo um povo.

“Em um momento em que vemos a censura voltar a mostrar as suas garras, em que os artistas são atacados, em que ressurgem o dirigismo, a arbitrariedade e a intolerância, em que verdades de uns querem suplantar as verdades dos outros, o espelho iraniano lembra que uma Cultura de raízes profundas vinga mesmo no terreno mais árido, que a desertificação não seca a humanidade de um povo, que a guerra não arrasa a história de uma civilização, que decretos restringem gestos, mas não têm poder sobre consciências”, refletem os diretores.